10h24 CEST
27/05/2021
“E se corre bem?”. A frase disse-a Rúben Amorim quando foi apresentado como treinador do Sporting, em Março de 2020. O contexto era terrível. Frederico Varandas e Hugo Viana tinham falhado as apostas em Marcel Keizer e em Jorge Silas e assumiam um “all-in” neste jovem treinador com poucos meses de banco, pelo qual se comprometiam a pagar dez milhões de euros ao SC Braga. Parecia demasiado risco. Um ano e dois meses depois, já pode dizer-se que sim, foi arriscado, mas que correu mesmo bem: o Sporting juntou a conquista da Liga à da Taça da Liga e pode agradecer à liderança de Rúben Amorim uma revitalização desportiva na qual poucos acreditariam depois da crise vivida em 2018 e que pode ser extremamente importante para os anos que aí vêm.
O título de campeão celebrado com uma equipa cheia de miúdos tem o carimbo de Amorim. Foi o treinador que construiu um plantel ganhador, que escolheu jogadores para a sua ideia de jogo e que depois soube explicar essa mesma ideia àqueles que não foi ele a escolher. Além disso, foi da sua liderança que brotou um grupo solidário, unido, divertido mas também responsável, montado em cima de uma capacidade ímpar de aligeirar, de afastar a pressão com um sorriso ou uma brincadeira enquanto isso foi possível, mas também de lhe responder em campo com rigor quando ela era inevitável.
É claro que este sucesso não se explica apenas com a condução de homens levada a cabo pelo treinador, ainda que esta tenha sido o principal fator diferenciador entre uma época regular e o nível excecional atingido pelo grupo. Havia qualidade, mas foi preciso saber enquadrá-la, como se viu, por exemplo, na subida de rendimento de Coates na linha de três atrás montada por Amorim. E foi, além disso, preciso coragem para apostar nela, porque boa parte dos jogadores fundamentais para este título são miúdos sem provas dadas, como Porro, Nuno Mendes, Gonçalo Inácio, Daniel Bragança, Matheus Nunes, Tiago Tomás ou até Pedro Gonçalves, que mesmo depois de ter sido decisivo na primeira volta ainda não era sequer titular na seleção de sub21.
Os miúdos cresceram enormidades ao longo do campeonato, colocando-se imediatamente atrás dos que parecem ter sido os pilares da conquista: Adán, um espanhol que deu aos leões a experiência na baliza; Coates, fundamental pela liderança e coordenação da linha defensiva e pelos golos decisivos quando se transformava em ponta-de-lança improvisado; Palhinha, jogador-cartaz do modelo de jogo de Amorim, porque dava à equipa o poder ganhar a bola na frente e contribuía decisivamente para o tamponar do jogo do adversário; e João Mário, cuja gestão de ritmos e capacidade para ligar jogo por dentro foi permitindo que os leões crescessem em posse também.
Claro que a estes pilares se juntaram muitos outros protagonistas que contribuíram sem ter de chamar a si os holofotes, como Feddal, Neto, Nuno Santos, Antunes, Paulinho e Jovane. Todos juntos transformaram um Sporting que começou como simples “outsider”, quase até por benevolência ou algum paternalismo, num justo campeão.
Sim, o Sporting beneficiou do afastamento prematuro da Liga Europa, a dar-lhe o tempo para trabalhar e repousar. Foi muito graças a esse tempo para aperfeiçoar o modelo em Outubro, Novembro e Dezembro, quando os adversários andavam a jogar duas vezes por semana, que os leões conseguiram ganhar a Liga. Mas a realidade nunca se explica recorrendo a apenas uma circunstância – ela depende sempre de todas e não só das que dão mais jeito. Se teve mais tempo para treinar e repousar, o Sporting também teve menos receita para recrutar, bem como menos moralização. Ainda assim, a derrota com o LASK foi um dos momentos decisivos da época dos leões.
Os outros foram-se sucedendo. O empate caseiro (2-2) com o FC Porto, a 17 de Outubro, foi a reabilitação, o “contem connosco” de uma equipa que na época anterior perdera as duas partidas que fizera com os dragões e as três que realizara com o Benfica. As vitórias contra SC Braga (2-0 na Liga e 1-0 na final da Taça da Liga), FC Porto (2-1 na meia-final da Taça da Liga) e Benfica (1-0 na Liga), todas entre 2 de Janeiro e 1 de Fevereiro, vieram mostrar que a equipa estava à altura e era mais do que um outsider – era já candidata. O empate (0-0) no Dragão, a 27 de Fevereiro, a manter a distância para o segundo em nove pontos, tornou o Sporting não apenas candidato mas favorito, a 13 jornadas do fim. Os empates com o Moreirense (1-1), FC Famalicão (1-1) e B SAD (2-2), todos em Abril, pareceram equivaler a algum medo cénico de ser feliz, que a equipa afastou ganhando em Braga (1-0), com dez homens, a 25 de Abril. Somada ao empate do FC Porto em Moreira de Cónegos no dia seguinte, essa vitória foi uma espécie de machadada final nas aspirações dos rivais: o Sporting estava ali para ser campeão.